terça-feira, 7 de abril de 2020

Tipo 1

Tenho a diabetes tipo 1 há quase 4 anos e desde lá a minha vida mudou. Mudou, apenas. Algumas coisas para pior, mas outras tantas para pior. Para quem não é conhecedor há dois tipos de diabetes: tipo 1 ou insulina dependente ou tipo 2. A tipo 1 é desenvolvida quando as células beta do pâncreas se "revoltam" contra o nosso sistema imunitário e deixam de produzir a hormona insulina (responsável pela transformação da glicose em energia). Não sabem ao certo a origem desta anomalia, apenas que ela é crónica - isso mesmo, tenho de diariamente colocar no meu corpo aquilo que ele produz ou produz de forma muito reduzida: injecções de insulina. Consigo imaginar a cara horrorizada das pessoas ao lerem isto, como observo sempre que tenho de picar o dedo em locais públicos para medir o índice glicémico ou então quando confidencio que vario os locais onde injecto a insulina (rabo ou zona abdominal).

Fui atleta durante a minha vida toda. Comecei a jogar andebol aos 6 anos, por isso foi para mim uma surpresa tudo isto. Mais do que surpresa... Revolta. Revolta porque sempre me exercitei a comi aquilo que se pode designar de saudável (o meu prato predilecto era arroz com atum...). Toda esta alteração no modo de vida e na minha rotina teve também um impacto psicológico. Se antes já me agradava o meu sossego, hoje em dia aprecio ainda mais o silêncio.

Passados 4 anos vivo super bem com a minha doença. Não faço questão de a esconder, sem qualquer preconceito. Ao inicio era desgastante justificar porque recusava sobremesas depois de um jantar, porque nunca alinhava a comer um gelado numa ida ao café, porque enchia o prato de vegetais na sua maioria em detrimento do arroz ou da massa (ainda ouvi umas piadinhas sobre dietas e tal...)... Agora simplesmente não me ralo, digo não e pronto. Cada um de nós deveria ter liberdade de dizer não sem ter de justificar de seguida ou ter "medo" de magoar, entristecer ou desiludir outra pessoa...

Hoje tive um pouco desse estado no meu dia. Não. Sem mais.

segunda-feira, 6 de abril de 2020

Quarentena

Estou desde o dia 19/03 em casa de quarentena em regime de teletrabalho. Sou administrativa de uma empresa de cobranças, por isso o meu trabalho faz-se lindamente a partir de casa. Sou devidamente acompanhada e avaliada dentro daquele que é o meu horário laboral normal (10h - 18h). Tudo exactamente igual apenas a diferença de estar sozinha. Atenção, aprecio fazer o meu trabalho de forma solitária. Sou disciplinada e focada (aprendi a ser deste modo porque em miúda era mesmo muito distraída) e é um alivio gigante não ter de andar sempre a correr para os transportes e com medo de perder o comboio que me faz chegar a casa a horas aceitáveis (sou senhora que gosta de acordar cedo e sair cedo também). O que me tem deixado inquieta é o facto de não poder caminhar na rua sempre que as minhas pernas e o meu espírito pedem. Costumo ir correr perto da praia (vivo a 2 minutos dela a pé) ou então opto pela corrida no mesmo sítio uns 15 minutos seguido do Yoga (esta troca já tinha sido efectuada antes de se instalar a pandemia), por isso nem nesse ponto estou descontente. Descontente fico por não ter o almoço habitual com os meus pais ao Domingo enquanto o Rui vai trabalhar ou as tardes de Sábado em que eu e a minha mãe somos turistas na própria cidade... Sim, os telemóveis encurtam a distância, contudo e para mal dos meus pecados ainda não substituem um abraço.

"Vamos todos ficar bem!"

domingo, 5 de abril de 2020

Ou é de mim ou este tempo de quarentena está a servir-me (e a todos nós) a darmos o real e importante valor que é a liberdade. Não há respostas exactas e ainda estamos longe de saber (acredito muito pouco que algum dia venha a ser revelada toda a verdade), todavia, tenho cada vez mais certeza que só chegamos a este ponto porque nos afastamos daquilo que é uma evidência tão difícil de aceitar: não somos o centro do mundo. Somos, sem dúvida alguma, uma parte determinante e valiosa, contudo, não somos e não podemos continuar a agir como donos e senhores. Toda esta vida de consumismo exacerbado, ingratidão, desigualdade, abundância de uns e carência de outros, o uso irracional dos recursos naturais... Quando iremos por fim perceber que a verdadeira doença é aquela que resulta dos nossos actos? Do nosso egoísmo? Da nossa teimosa estupidez?

Escrevo estas palavras e observo a chuva que caí do outro lado do vidro e pergunto a mim mesma o que vem de mau ainda será pior...